As tragédias vivenciadas especialmente pelo Rio Grande do Sul e Sul de Santa Catarina nos últimos meses têm ganhado destaque nacional e internacional, principalmente devido às suas proporções e impactos. Evento extremos dessa natureza sempre foram uma preocupação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Araranguá e Afluentes Catarinenses do Rio Mampituba e, por isso, ganharam destaque na capacitação promovida nesta semana, com a temática “Monitoramento Hidrológico e Eventos Críticos”.
A questão foi abordada por de três profissionais com grande expertise e bagagem técnica na área durante a primeira capacitação do órgão de 2024. Entre eles, o professor titular do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), doutor Masato Kobiyama. O palestrante alertou que os desastres naturais continuarão a acontecer e que, por este motivo, o essencial é garantir o monitoramento hidrológico e o investimento em educação para, assim, manter-se preparado.
Para Kobiyama, os fenômenos naturais são difíceis de controlar, tonando imprescindível a preparação de todos para enfrentá-los. Uma das maneiras reforçadas pelo professor é o fortalecimento do conhecimento de cada cidadão. “Os adultos têm muita noção da velocidade com que estão dirigindo um carro, por mais que não olhem o velocímetro. Mas por que não conseguem mensurar a quantidade de chuva ao olhar para a rua? Pois não foram ensinados a como mensurá-la. Precisamos que as pessoas entendam melhor a hidrologia, para termos pessoas mais atentas”, frisou.
Outra perspectiva trazida por Kobiyama, ainda, é de que os lugares com mais belezas naturais podem ser os mais perigosos neste cenário, só que a população, em geral, não percebe. “Temos que estar preparados para enfrentar as violências naturais que a beleza natural pode provocar. Para isso, precisamos educar todos, desde as crianças até os mais idosos”, acrescenta.
O efeito das mudanças climáticas
Por conta do atual modelo hegemônico de produção e consumo da sociedade, os efeitos das mudanças climáticas daqui para frente serão cada vez frequentes e de maior intensidade. Ressaltando esse efeito sobre os recursos hídricos, o professor doutor Carlyle Torres Bezerra de Menezes, que é coordenador geral do ProFor Águas Unesc – equipe técnica da Entidade Executiva –, trouxe em sua abordagem maneiras de reduzir os riscos e a vulnerabilidade social.
“Devido aos acontecimentos recentes, a sociedade como um todo, diante das evidências, está despertando para a gravidade do problema. Essa capacitação foi uma contribuição para buscarmos alternativas para a adaptação e mitigação dos impactos das mudanças climáticas”, destaca Menezes, que também é coordenador adjunto do Programa de Pós-graduação em Ciências Ambientais (PPGCA) da Unesc e professor do curso de graduação em Engenharia Ambiental e sanitária.
Outro ponto de reflexão proporcionado por Menezes está no fato de as consequências desse processo não impactarem de maneira igualitária, toda a população. “As comunidades mais vulneráreis, mais pobres, como negros, mulheres, povos tradicionais, são as que menos contribuíram para a poluição, em termos de padrão de produção e consumo, mas são as atingidas com maior gravidade e possuem maior dificuldade para enfrentar e superar esses problemas. E nós também precisamos pensar nessa questão”, complementa.
O futuro
Analisando as mudanças climáticas no mundo, observa Kobiyama, é provável que Santa Catarina ainda sofrerá com novos desastres naturais. Justamente por este motivo, o fato de o Comitê Araranguá e Afluentes do Mampituba reunir os membros e a sociedade para debater o tema e buscar articulação para enfrentar o problema torna-se extremamente importante.
Diante dessa situação, segundo o professor, além da educação, o monitoramento hidrológico é o ponto de partida. A estratégia consiste, basicamente, em monitorar a chuva, bem como o nível e vasão dos rios de interesse de uma bacia. E o acompanhamento e análise dessas informações ao longo do tempo é de suma importância para melhor planejamento de medidas estruturais e não estruturais.
“O que um técnico de futebol faz antes de uma partida? Estuda o time adversário. Ou seja, quando conhecemos nosso adversário, não precisamos ter medo e conseguiremos vencer o jogo. Assim, os participantes da capacitação devem conhecer os seus adversários, isto é, a chuva, os rios, entre outros. Se os participantes forem para casa e compartilharem essas informações com sua rede de contatos, multiplicaremos conhecimento”, evidencia Kobiyama.
Base de informações
Para que os membros compreendessem, de maneira geral, como funciona o monitoramento hidrológico no Brasil e em Santa Catarina, o agente de pesquisa da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI), José Luiz Rocha Oliveira, explanou um pouco sobre o processo. Além disso, também explicou os equipamentos empregados, os pontos de monitoramento no estado e na bacia do Rio Araranguá.
“Só conseguimos planejar e fazer uso daquilo que a gente conhece. Por isso, esta ferramenta é de suma importância. Ele é a base para todas as outras informações voltadas às decisões sobre as águas. Em especial, no caso do Comitê Araranguá, que é regularmente afetada por eventos críticos, como enchentes, inundações ou secas e estiagens”, acrescenta.
*Comitê como fonte de conhecimento*
Nesse sentido, ao proporcionar capacitações relacionadas aos recursos hídricos, conforme a presidente do Comitê Araranguá e Afluentes do Mampituba, Eliandra Gomes Marques, o órgão cumpre seu papel social, no que diz respeito à mobilização e conscientização.
“A formação sobre monitoramento hidrológico e eventos climáticos, proposta pelo Comitê, foi essencial para entender os impactos das emergências climáticas e os fenômenos hidrológicos. Ela capacitou profissionais, ligados especialmente às entidades-membro, para analisar padrões de chuvas, níveis de rios e prever inundações, promovendo, assim, a segurança e o uso sustentável dos recursos hídricos. Com esse conhecimento, será viável desenvolver planos de gestão eficazes, reduzindo os riscos associados a eventos extremos. Além disso, a formação contribui para a conscientização e engajamento da comunidade local na preservação ambiental e na resposta a desastres naturais que estão sendo frequentes em nosso território”, ressaltou Eliandra.